domingo, dezembro 25, 2005

Fosse eu um anjo

Desci às profundezas do inferno.
Desci. Sujeitei-me ao juízo dos outros,
Nem sequer levei as asas de água
Que já me levaram de onda em onda.
Foi o vento quem me tirou o ar;
Perco o espaço em volta, inerte,
Só o fogo me consome, já morto.

Esta ampola que me controla
Não é de areia, é de água:
Escorre-me pelos dedos; nem um grão.

Fosse eu um anjo...
O vento não me roubaria o fôlego.
Mas não passo de uma alma penada,
Só, sem sequer a companhia da morte.

Gonçalo Taipa Teixeira
16 de Julho de 2003

sábado, dezembro 24, 2005

FELIZ NATAL!!!!

quinta-feira, dezembro 22, 2005

Calor

A ventoinha sopra em vão
Abafada pelo que o Sol aquece
Como aquece o chão, que aquece o ar.
O meu corpo, engolido pelo calor,
Desespera pela frescura de um sorriso.

Um sorriso desconhecido
De negros olhos fundos, preciosos.
Um sorriso que me faça sonhar
Fingir que me apaixono, sem palavras.
Imagino que me desejas
Como eu te desejo.

E no meio do calor amamo-nos,
Sem deixar que o sonho acabe;
Sem acordar, puxando-me para a dor,
A realidade que darteja gargalhadas
Por eu sonhar ter sonhos escondidos.
Por fugir à realidade do suor.

Gonçalo Taipa Teixeira
14 de Outubro de 2003

segunda-feira, dezembro 19, 2005

Dias

São dias, estes que passam,
Desde que nasci, dias.
Lentos que maçam, maceram e trituram
E nem ousam acabar.
Uns em cima dos outros
Levaram o Sol à loucura,
Preso ao calor madraço.
Fizeram da Lua fria lâmina
Que me corta a vontade;
Atira-me ao chão, cansado, acordado.

Assim, fico à espera.
Vejo os dias passarem na montra.
Olho para a frente, tento prever
Dos dias, o último.

Gonçalo Taipa Teixeira
14 de Março de 2005

sexta-feira, dezembro 16, 2005

O sino, grande

Era um sino grande,
Ao vento calado, lá no alto,
No campanário pendurado.
Era pequena a igreja,
Do tamanho da aldeia, pequena,
Mas tinha um sino, grande.

Foram algumas colectas, muitas,
Mandaram fazer o sino;
Grande. Ouvissem as aldeias
Que os vizinhos tinham sino.
Muito barulho faria o dito, grande,
Mesmo que badalasse uma morte.

Foi muito o dinheiro, suado.
Nunca tal quantia vista por ali.
Tinha que ser grande, o sino,
Por tanto suor, enorme.
Custou caro, o sino, grande.
Mas para o badalo… não sobrou tostão!

Gonçalo Taipa Teixeira
29 de Outubro de 2004

Esforço

Não sei porque me esforço
Não sei sequer se me esforço
Nem sei se vale a pena
Porque a minha vontade sentida
É a de não ter vontade nenhuma.

Gonçalo Taipa Teixeira
3 de Julho de 2003

quarta-feira, dezembro 14, 2005

Asas perdidas

Perco penas das minhas asas;
Perco as asas dia a dia
Arranca-mas o vento, uivando,
Ou as palavras que me atacam
Desfazem-me o espírito, cegas,
Gritando-me que estou errado.

Já não posso voar nas alturas
Onde os sonhos são livres e claros
Onde os gritos e os berros se riem
Sem saber o que é o pecado
Ou até onde deixam ir os sorrisos.
Mas as asas são coisas de doidos...

Gonçalo Taipa Teixeira
10 de Agosto de 2003

sábado, dezembro 10, 2005

Olhos de água

Duvidoso cruzamento de pequena dúvida
Encruzilhada inevitável na minha cama.
Serei eu injusto? Ou serei apenas eu?
Dúvidas cancerosas que me atordoam.

Certeza e ninho feito de Lua em Lua...
Aventura na ponta de uma flecha...

Escolhas a mais, na escada que não se desce,
Sem arlequins culpados, só culpas e chagas:
Dói seguir estrada sem roubar os frutos;
Dói deixar a estrada de destino confesso.

Pantufas quentes que os pés conhecem...
Pés descalços, livres para sentir o chão...

São estes olhos de água que me ameaçam
Chamam-me em segredo, não dizem nada.
É este sorriso em combustões instantâneas
Que me assombra o reflexo da paixão...

Dia de céu aberto no meio do Sol de Verão...
Noite intensamente estrelada de Lua incerta...

Talvez sejam as certezas que me testam,
Provam que não ensombram nem reflectem.
Talvez seja um poema que me avisa, já gasto,
Que o rio segue para os poços de águas verdes...

Gonçalo Taipa Teixeira
20 de Novembro de 1999

terça-feira, dezembro 06, 2005

Fosse eu uma brisa quente

Fosse eu uma brisa quente
Carregado de cantos frescos
Numa calma manhã de Agosto
Passeando a rouca voz
Pelo teu corpo florido

Fosse eu uma pena de gaivota
Nas asas de prata adormecida
Num real sonho de Verão
Tocando, fazendo sorrir
A doce seda dos teus lábios

Fosse eu a crista de uma onda
Subindo, furioso, ansioso
Espumando, de braços abertos
Atirando-me em mil desejos
Entre as tuas madeixas de areia

Fosse eu um simples toque
Um leve roçar, um beijo
Uma gargalhada escondida
Atrás de um papel inventado
Onde escrevi que te amo...

Gonçalo Taipa Teixeira
1 de Julho de 2000

Há já nove anos que viajo de mão dada com a inspiradora deste texto. Foi este o poema que escolhi para assinalar este dia seis de Dezembro.

domingo, dezembro 04, 2005

Acordar

Desço fundo nesta brisa carregada;
Leva-me o vento que Hades exala.
Quieto, inerte, rendido ao Sol,
Ao quieto desabrochar deste Inferno
Que o meu tempo engole, passivo.
Desço a pique, quero renascer,
Chamar-me Fénix e voar sob o Sol,
Mas a Lua não me leva, provoca-me.

Soterrado em estrelas alheias
Adormeço, sonâmbulo, sem sonhos.
Sou um estranho no meu destino,
No qual viajo aos empurrões.
O Mundo não me guardou lugar
E o meu coração é negro:
Sou uma sombra do meio-dia;
Encurtaram-me as asas geniais
Sou só um monte de rédeas banais.
Vou talvez dormir, a ver se acordo...

Gonçalo Taipa Teixeira
16 de Março de 2004

sexta-feira, dezembro 02, 2005

Gatos afiados

Maçado. Amolecido. Amassado.
Sou uma conta do ábaco
Em que os dias me descontam.
Sou um pêndulo arrítmico,
Brinquedo de um qualquer gato;
Sacudo, empurrado, sem destino.

Verto baboseiras ensinadas,
Descarrego-as, nem as guardo.
A vontade não existe sem treino,
E foi ensinada a não existir.
E a fila de gatos afiados
Aumenta a cada Sol que nasce.

Gonçalo Taipa Teixeira
15 de Julho de 2004